Este diário complementa o nosso site pessoal

( VER ETIQUETAS NO FIM DA PÁGINA )

USE O PESQUISADOR DO BLOGUE -

-

OS TRATAMENTOS SUGERIDOS NÃO DISPENSAM A INTERVENÇÃO DE TERAPEUTA OU MÉDICO ASSISTENTE.

ARTE

domingo, 26 de outubro de 2014

OS MEUS MORTOS E SEUS VIZINHOS



corre um silêncio pela aldeia        uma brisa ligeira traz-me as horas do relógio da torre da igreja sempre oportuno
os cães já não ladram e os habitantes velhos e exaustos adormeceram há muito        passeio-me pelos luzeiros que se debruçam na varanda púrpura das nuvens deixando-me embalar pelo canto das cigarras e dos grilos        cantata minimalista dos simples a contrastar com o preciosismo de bach que ouço enquanto a insónia não mergulha nos montes        a paz instala-se no cigarro de todas as noites teimosamente sorvido

a madrugada vem medrosa e carente e um dos loucos da aldeia meu velho amigo da infância e da adolescência canta glórias e aleluias a caminho do cemitério      passa das quatro     sua hora de visita aos nossos mortos

penso na vénus de botticelli        agrada-me a presença da sua imagem sem a desejar
a ausência de anseios faz germinar o deleite da beatitude
penso        penso também se não será a paz que faz cessar os desejos        seja como for
o zé já estará a rezar no cemitério percorrendo as campas nuas e as empedradas      sortido de inscrições lágrimas e falsidades        reza aos seus mortos e aos dos outros como cava nas noites de luar os arretos deste e daquele

um destes dias irei visitar os meus mortos e seus vizinhos





Sem comentários: