sábado, 9 de maio de 2009

A GRIPE DOS "HOMENS"



Sentado no quarto da Quinta do Crestelo, a Serra impõe a lareira acesa que o frio mais parece de Janeiro do que de Abril, uma catarreira de que já não possuo lembrança e escrevo apenas, logo depois de terminar o artigo sobre a Gripe Suína – agora com pompa e circunstância denominada gripe A (H1N1) –

Um homem com gripe
E uma carpideira –
Não vislumbro diferença.

Estes versos, fizeram-me lembrar um poema. Remexo as minhas notas, papeis amarelecidos pelo tempo e encontro-o um tanto amarrotado. Que o Antunes me perdoe, já que o resto está apagado por um borrão de café...

Pachos na testa
terço na mão
uma botija
chá de limão
zaragatoas
vinho com mel
três aspirinas
creme na pele
grito de medo
chamo a mulher
ai Lurdes Lurdes
que vou morrer
mede-me a febre
olha-me a goela
cala os miúdos
fecha a janela
não quero canja
nem a salada
ai Lurdes Lurdes
não vales nada
se tu sonhasses
como me sinto
já vejo a morte
nunca te minto
já vejo o inferno
chamas diabos
anjos estranhos
cornos e rabos
vejo os demónios
nas suas danças
tigres sem listras
bodes de tranças
choros de coruja
risos de grilo
ai Lurdes Lurdes
que foi aquilo
não é a chuva
no meu postigo
fica comigo
não é o vento
a cirandar
nem são as vozes
que vêm do mar
não é o pingo
de uma torneira
põe-me a santinha
à cabeceira
compõe-me a colcha
fala ao prior
pousa o Jesus
no cobertor
chama o doutor
passa a chamada
ai Lurdes Lurdes
nem dás por nada
faz-me tisanas
e pão-de-ló
não te levantes
que fico só
aqui sozinho
a apodrecer
ai Lurdes Lurdes
que vou morrer.

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