Desciam a rua
Pálidos
Esquálidos
Com o sangue coalhado
Nas palmas das mãos
Com eles
Um cão
No passeio matinal
Levantava a pata
Ameaçando o inevitável
Nas esquinas obsoletas do esforço
Caminhavam com gravatas
Vermelhas
Da moda
Subindo escadas de claustrofobia
Elevadores montes-de-gente
Sem rosto
Transparentes
Um dia mais
Igual à sonora carruagem do quotidiano
Mais um dia
Igual aos modos cinzentos do rapaz da pastelaria
Computadores a acender-se ao raiar da aurora
Números rodeados de sinais cabalísticos
Fixavam-se na economia plana dos monitores
Gastos por olhares depressivos
Papel de luzes opacas amontoado em cadeiras mortalmente desocupadas
As mesmas palavras os mesmos rituais a mesma vigília descontente os mesmos carros a rolarem nas suas marcas a exibirem seus modelos
Mulheres com calças de contrafacção comprimiam-se na celulite exposta aos olhos interiores dos quartos acesos
Uma argamassa de pó betumara as rugas do desvario
Numa qualquer hora diurna dos motéis da auto-estrada
Apressando-se numa corrida surda
Inflamando os sentidos erécteis do despertar
Apercebi-me então
Da sua essência
Vivos-mortos
Caminhei a seu lado na nuvem ilusória da calçada
Em transportes destinados a um outro mundo
Com rodados flutuantes de sonhos materializados
Execução orçamental de parlamento acocorado em vis destroços de restos humanos naufragados
Agora já estou só
As conversas apagaram-se
O Sol acende-se com lentidão no horizonte queimando o último azeite da miséria
Iluminando prédios escurecidos de melancolia com raios branco-pardo
Os mortos-vivos recolheram às suas celas
Para poderem viver momentos de crepúsculo
E voltarem amanhã depois do sono
A morrer
Nas mesmas calçadas de sempre
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