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ARTE

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

NOITE NA SÉ






Noite na Sé
A ceia que nem sempre tarda
Aos pombos recolhidos tardava
E aí
Num Amor forte como a Morte

Dividimos nossas almas
Na insolência do encontro
Decisão de inevitável união
Quase canibalesca
De espíritos insatisfeitos

A noite agarrou-se com firmeza
À pedraria da catedral
A acender os últimos eléctricos
Enquanto nos afastávamos
Afáveis desconfiados

Nas ruas desertas
Que desde sempre
Parecias conhecer
Olhavas-me pelo canto
De um olhar negro

Inundado de paz
Onde havia almofadas
Pelo chão estendidas
Com gente descrente
Estampada nos cantos

Na sala gente
Vestida de desejo
Verdejava palavras
Rastejantes
Que te procuravam

Almofadas escarlates
Azuis de céu ultramarino
E talvez
De âmbar desmaiado
Talvez

Mas só tu existias
Na orientalidade graciosa
Como exististes na
Longa noite africana
De volúpia contida

Por tanto tempo
Que nenhum relógio
Pode medir
Nenhuma ampulheta
Em si conter

Minhas mãos
De olhos fechados
Penteavam suavemente
Os cabelos lisos
De tua alma límpida

Absurdamente límpida

Não era sexo
Ou era sexo
Sem ser sexo

Noites estranhas
De delícias imponderáveis
No silêncio
Da árvore contemplativa

Espasmos rítmicos
De ramos orvalhados
A beijar os lençóis brancos
As rendas de teu perfume
E o sândalo dos sentidos
Efervescentes

O vizinho perguntou
O namorado já não vem?

Os roucos gemidos cessaram
A alegria do sangue nascente
Laqueou o flanco inerte
A mente dolorida
Adormeceu no leito do sofrimento
Onde os sonhos
São breu de noite sem fim

As feridas abertas
Em puro vinagre
Sararam

Uma não
Sara
Essa irá a morte
Sará-la com suas mãos
De veludo e Amor
Gentil na voz
Nos gestos de vinho doce
Nos suaves beijos
Rumor de mar


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