foi na morada da serra nascida do gelo e amamentada pelos torgais que das alturas mergulhei pela primeira vez nos abismos
meia-dúzia de chalés no lugarejo
um charco iluminou-se ao som da lua naquele local haviam uivado tristes tísicos nas noites plantadas de frígidas estrelas
ao amanhecer um manto de neve cobria todas as emoções sentimentos e afectos os pensamentos escorriam nas falanges regeladas
no vale das éguas um silêncio sepulcral e as penhas douradas ainda orvalhadas projectavam sombras vivas na lagoa de cristal
ali estava o meu oceano as caravelas de antanho os velozes veleiros do algodão com seus capitães ferozmente tisnados pelo sol dos mares embravecidos do sul
canibais vestidos de azul
na vila submissa ajoelhada aos pés dos cumes graníticos bebia-se o sangue da terra negra esventrada por nossos avós
um garimpeiro de almas abrira as portas do campanário deserto a casa ao lado habitada por giestas e por bem-nascido silvado estava à venda
ninguém comprava nada o pároco só no confessionário
deus tinha andado por ali naquele vazio inóspito de floreiras murchas e de vasos despedaçados afastara-se entediado a senhora t… da casa da águia asseverou que andava por assedasse
se por lá andasse – como se eu acreditasse – já teria sido visto
observador de raios criadores e trovões demolidores como era sou e o ignoro
os degraus da sala desciam por um portal semiaberto
daí haviam partido em pânico e sufoco todos os descobridores de monstros e animais fantásticos
mares de olhos negros onde rugiam cravos mágicos
nos rochedos do firmamento ouviam-se os cânticos do sangue coalhado
um quadro a óleo na parede virgem
- a música é um modelo para a pintura –
uma fenda no tabique do lado de lá da realidade o mais belo de todos os tesoiros
nem pratas nem oiros nem pedras preciosas
na escuridão amorosas ninfas subterrâneas
um vazio um nada
queda vertiginosa no vórtice do sonho
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