NAN YAR
QUEM SOU EU?
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Antes de encontrar o Si, a dúvida e a incerteza serão os nossos companheiros. Que adianta saber de tudo, ser-se um erudito, um filósofo ou cientista famoso, quando ainda não sabemos quem somos nós?
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RAMANA MAHARSHI – BIOGRAFIA BREVE
(extraído de
- RAMANA MAHARSHI – MEDITAÇÃO – QUEM SOU EU?
Em LIVROS ONLINE
Vida e ensinamentos de Bhagavan* Sri Ramana Maharshi
Onde se explana o método preconizado por Maharshi de uma forma sucinta e imediatamente compreensível.)
- * Bhagavan – Deus ou sábio místico que atingiu a união com Deus. -
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Ramana Maharshi nasceu em 30 de Dezembro de 1879 em Tiruchuzhi, no sul da Índia, e faleceu no dia 14 de Abril de 1950.
Veio a ser reconhecido como mestre do Advaita Vedanta* e homem de enorme santidade, quer na Índia quer no Ocidente, mas como veremos, a sua realização antecedeu a leitura da obra principal do Vedanta não-dualista, Viveka-Chuda-Mani de Shankaracharya.
- * Advaita Vedanta ou Vedanta da não-dualidade, doutrina que afirma que nada existe separado do Espírito, mas em que tudo é uma forma assumida pelo Espírito; conceito de Absoluto, no qual o homem é reabsorvido Naquilo que é a sua fonte e Si real, subsistindo na pura Bem-aventurança e ilimitada Consciência de Ser. –
Teve uma infância normal, mas duas características chamaram a atenção da família: um sono excessivamente profundo e uma força física anormal para a sua idade. Nada fazia prever que estaríamos perante um dos maiores místicos dos séculos XIX e XX.
O pai de Ramana faleceu quando este tinha quinze anos e Ramana foi viver com um tio para a cidade de Madura.
Aos 16 anos, passou por uma extraordinária experiência relacionada com a morte, sem que nada tivesse exercitado para a obter.
Estando só, sentado numa sala da residência foi acometido por um intenso medo da morte. Sentiu que ia morrer. Não obstante, não entrou em pânico e começou a pensar nesse novo facto que ocorria na sua existência. Interiorizou o medo terrível que o afligia e perguntou a si mesmo:
- A morte veio, o que é que essa morte representa? O que é que está a morrer?
O corpo morre, pensou.
Estendeu-se e começou a imitar um cadáver. Reteve a respiração e disse para si mesmo, “este corpo está morto, será cremado e reduzido a cinzas”.
Continuou a inquirir-se:
- Com a morte deste corpo eu também morro?
- Este corpo é o “Eu”?
Apesar do corpo imitar com perfeição a morte, Ramana não deixou de sentir a sua existência e o próprio “Eu”. O “Eu” que se manifestava não fazia parte do corpo, estava separado dele.
Aí, intuiu, experimentando uma verdade inquestionável:
- Eu sou Espírito que não pode ser afectado pela morte. O Espírito está para além do corpo e de todas as suas funções e é imortal.
A partir desse momento o medo da morte extinguiu-se por completo e Ramana passou a desfrutar de uma contínua imersão no Ser.
O ego permitira-lhe ter medo da morte. Mas este desapareceu quando o jovem Ramana fundiu o seu “Eu” com o Self (Si) infinito e eterno ou seja com o Espírito.
Nunca mais teria medo da morte. O seu “eu” extinguir-se-ia com a destruição do corpo, mas o “Eu” verdadeiro não estava submetido às leis da dissolução.
A compreensão ocorreu muito rapidamente, sem procura, sem luta, sem preparação consciente.
Não se tratava de pensamentos obscuros, foi uma verdade viva que brilhou através dele e que fez com que a compreendesse directamente, quase sem o processo do pensamento.
O medo da morte desapareceu de vez, e a absorção no Ser continuou ininterrupta desde então.
Segundo o jovem Mestre, o primeiro de todos os pensamentos é o pensamento “Eu”. É após este que surgem todos os outros. Se perseguirmos o “Eu” até à sua origem, este que é o primeiro e último pensamento, acabará por se dissipar.
Quando negamos o facto de sermos este corpo e tudo o que o compõe, mesmo a mente donde nasce o ego, afirmando “Eu não sou este corpo”, podemos constatar que resta a consciência pura que permanece em nós, só e por si mesma. Aí declaramos: “Eu sou”. Eu sou essa consciência que é Existência, Consciência e Felicidade.
Dissipados que estejam os pensamentos, poderemos despertar para o Si, natureza real de todos os homens, que está para além da mente e que é eterno e infinito.
Ramana atingira a Libertação e com ela toda a sua vida se modificou, renunciando ao mundo exterior.
É interessante anotar que afirmava ter sido feliz por nunca se ter interessado pela filosofia e que se o tivesse feito não teria chegado a lugar algum.
Um dia, tomou a decisão de abandonar a casa onde vivia com os seus tios deixando uma carta onde referiu ter partido em busca de seu Pai e pediu para que não se preocupassem com o facto, nomeadamente desperdiçando dinheiro à sua procura.
Partiu para Tiruvannamalai, 190 Km ao Sul de Madras, perto da montanha de Arunachala onde por renúncia se libertou do dinheiro que transportava, nunca mais tocando em qualquer moeda ou nota e do colar sagrado, passando apenas a vestir uma tanga.
Ramana desapegou-se do mundo e estabeleceu-se definitivamente no Si, descurando por completo o seu corpo quer na alimentação quer na higiene, comendo apenas uma tigela de comida diariamente e não tomando banho.
Passava a maior parte do tempo em silêncio e imerso no Si.
Alguns anos depois de ter abandonado a casa foi encontrado pelos seus parentes que tudo fizeram para que retornasse a Madura, o que não fez.
A sua mãe permaneceu com ele durante bastante tempo, mas Ramana não lhe prestava qualquer atenção especial.
Por essa altura tinha feito um voto de silêncio e limitou-se a escrever algumas linhas: “O que tudo ordena controla os destinos das almas segundo o seu Prarabdhakarma. Tudo o que não está destinado a acontecer não acontecerá, tente-se fazer o que se quiser. Tudo o que está destinado a acontecer acontecerá, faça-se seja o que for para o impedir. Isto é verdadeiro. O melhor caminho, portanto é ficar calado.”
Virupaksha – entrada para a gruta
Durante os primeiros anos em Virupaksha, quando ainda guardava silêncio, redigiu em várias ocasiões, instruções para um seu discípulo, Gambiram Seshayyar. Depois da morte deste, as mencionadas instruções foram ordenadas e publicadas com o título de “Auto-investigação”*.
- * Ver em LIVROS ONLINE -
AUTO-INVESTIGAÇÃO – RAMANA MAHARSHI -
- Vicharasangraham.
Do mesmo modo e na mesma época, as suas respostas dadas a Sivaprakasam Pillai foram ampliadas e compostas em forma de livro sob o título de “Quem sou Eu?”.
Pillai
Estes dois livros são os únicos escritos em prosa por Sri Bhagavan Ramana Maharshi.
Escreveu alguns poemas e fez algumas traduções, entre as quais a do livro Viveka-Chuda-Mani, uma pérola do Advaita Vedanta, de Shankaracharya, que correspondia à doutrina que Ramana ensinava e que era o mais puro Advaita. No entanto, não tinha sido o pensamento de Shankaracharya a orientar Bhagavan na senda da liberdade. Ramana obteve o estado de libertação antes de conhecer os escritos de Shankaracharya, não obstante viesse a reconhecer no representante do Vedanta não-dualista a verdade que havia experienciado.
Há um episódio interessante ocorrido entre um poeta que o visitou e Maharshi.
Maharshi disse:
- A poesia é apenas actividade da mente. Quanto mais se exercita a mente, quanto mais êxito se tem na composição de versos, menos paz se tem. Que adianta adquirir qualidades se não nos é dada a paz de espírito?
De alguma forma, Maharshi nunca pensou em escrever um livro ou compor poemas. Confessou, que nos poemas que escreveu as palavras fluíram sem qualquer esforço, não se tendo a actividade poética constituído como um obstáculo à paz que sentia.
A mãe de Ramana voltou para casa. Por seu turno, Ramana começou a ter um comportamento diferente, minimizando o ascetismo a que se devotara.
Depois de ter passado dois anos em Tiruvannamalai, vivendo ao relento e em templos, estabeleceu a sua morada em Arunachala, monte sagrado da Índia.
Em Arunachala, onde já tinha um grupo de devotos foi construído um Ashram.
Início do Ramanarasmam - 1922
O número de devotos aumentava, os seus ensinamentos disseminaram-se pelo mundo e o Ashram era cada vez mais conhecido.
A partir do ano de 1947 a saúde de Ramana deteriorou-se. Em 1949 foi-lhe diagnosticado um tumor maligno. Ramana aceitou a doença e a morte inevitável. Ele nunca iria valorizar o corpo e o tempo de vida deste.
Faleceu no dia 14 de Abril de 1950 com a certeza de que apenas o corpo morre, o que não constitui qualquer tragédia.
Contrariamente a muitos sábios e santos hindus nunca se referiu à sua eventual reencarnação ou libertação definitiva do ciclo de nascimentos e mortes.
Questionado sobre o assunto limitou-se a responder:
“Quando morrer não me irei embora. Para onde haveria eu de ir?” ou “Não me irei embora, estou aqui”.
Ramana, místico hindu, está aqui no eterno agora.
Funeral – foto de Cartier-Bresson
José Maria Alves
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INTRODUÇÃO A NAN YAR
“Quem sou Eu?” é o título dado a um conjunto de perguntas e respostas que conduzem à Auto-investigação, ou indagação do Ser. As questões foram colocadas a Bhagavan Sri Ramana Maharshi por Sri M. Sivaprakasam Pillai por volta de 1902. Sri Pillai, licenciado em Filosofia, trabalhava na época no Departamento de Impostos Públicos da “South Arcot Collectorate”. Durante a sua estadia em Tiruvannamalai no ano de 1902, em trabalho oficial, Sri Pillai visitou Virupaksha no monte Arunachala e aí conheceu Maharshi, a quem pediu orientação espiritual, buscando respostas para questões relacionadas com a Auto-investigação. Como Bhagavan na altura não falava, não por qualquer voto que tivesse feito, mas porque não se sentia inclinado a falar, respondeu às questões que lhe foram colocadas por escrito. Tal como tomadas e registadas por Sri Sivaprakasam Pilai, tratava-se de treze questões com respostas que lhe foram dadas por Bhagavan. Este registo foi publicado pela primeira vez por Sri Pillai em 1923 (em Tamil), conjuntamente com dois poemas seus, relatando o modo como a graça de Bhagavan actuara nele, dissipando-lhe as suas dúvidas e salvando-o de uma crise na sua vida. “Quem sou Eu?” tem vindo a ser editado sucessivamente. Em algumas das edições encontramos treze perguntas e respostas e noutras vinte e oito. Existe uma outra versão publicada, na qual as questões não aparecem, e os ensinamentos estão organizados na forma de ensaio. A tradução inglesa existente resulta deste ensaio. A presente versão tem por base o texto em forma de vinte e oito perguntas e respostas.
Junto com Vicharasangraham (Auto-investigação), Nan Yar (Quem sou Eu?) constitui o primeiro conjunto de instruções nas próprias palavras do Mestre. Entre os trabalhos de Bhagavan, estes dois são os únicos textos em prosa. Apresentam muito claramente o ensinamento central de que o caminho directo para a libertação é a Auto-indagação. O modo particular em que a investigação deve ser feita é estabelecido com clareza em Nan Yar. A mente é constituída por pensamentos. O pensamento “eu” é o primeiro a surgir na mente. Quando a questão fundamental “Quem sou Eu?” é persistentemente perseguida, todos os outros pensamentos são destruídos e, finalmente, o próprio pensamento “eu” desaparece, restando apenas o supremo não-dual Si. Termina-se, então, com a falsa identificação do Si com os fenómenos do não-Si, tais como o corpo e a mente, e dá-se a iluminação, sakshatkara. Obviamente o processo de investigação, não é um processo fácil. Quando perguntamos “Quem sou eu?”, outros pensamentos irão surgir; mas à medida que surgem não se lhes deve ceder, seguindo-os, e pelo contrário devemos perguntar “A quem surgem estes pensamentos?” Para o conseguir fazer devemos estar extremamente vigilantes.
Através de uma constante investigação, devemos fazer com que a mente se mantenha na sua fonte, sem permitir que ela se disperse e perca nos labirintos do pensamento, por si própria criados. Todas as outras disciplinas, tais como o controlo da respiração e a meditação nas formas de Deus devem ser consideradas como práticas auxiliares. São úteis na medida em que auxiliam a mente a tornar-se calma e focada.
Para a mente que conseguiu concentrar-se, a Auto-investigação torna-se relativamente fácil. É através de uma incessável investigação que os pensamentos são destruídos e o Si se realiza – a Realidade plena, na qual não há nem mesmo o pensamento “eu”, experiência que é referida como “Silêncio”.
Isto é na sua essência o ensinamento de Sri Ramana Maharshi em Nan Yar.
(Quem sou Eu?)
T.P.M. Mahadevan
Universidade de Madras, 30 de Junho de 1982.
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QUEM SOU EU?
(NAN YAR?)
Todos os seres vivos desejam ser felizes, sem qualquer sofrimento. Em todos observamos um supremo amor por si mesmo. E só a felicidade é a causa do amor. Para obter essa felicidade que é a nossa própria natureza, experienciada no estado de sono profundo onde não há mente, devemos conhecer-nos a nós próprios. Para o alcançar, o caminho da sabedoria, a investigação na forma de “Quem sou Eu?” é o principal meio.
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1. Quem sou Eu?
O corpo físico que é composto pelos sete humores*: Eu não sou.
- * dhatus – plasma, sangue, músculos, gordura, ossos, medula óssea, sémen. -
Os cinco órgãos dos sentidos de cognição, a saber, audição, tacto, visão, paladar e olfacto, que compreendem os seus respectivos objectos, a saber, som, toque, cor, sabor e cheiro: Eu não sou.
Os cinco órgãos de cognição dos sentidos, a saber, os órgãos da fala, da locomoção, do agarrar, da excreção e procriação, que têm como suas respectivas funções, as de falar, de se movimentar, de excretar, e ter prazer: Eu não sou.
Os cinco sopros vitais, que actuam respectivamente nas cinco funções do respirar*: Eu não sou.
- * Prana, aprana, vyana, udana e samana. -
Mesmo a mente que pensa: Eu não sou.
Nem tão-pouco a ignorância, que só abrange as impressões residuais dos objectos, na qual não há objectos e nenhuma função: Eu não sou.
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2. Se eu não sou nada do que disse, então quem sou Eu?
Depois de negar tudo o que foi mencionado como “eu não sou isto”, “eu não sou isto”, a consciência que permanece só e por si mesma, essa: Eu sou.
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3. Qual é a natureza da Consciência de Si?
A natureza da Consciência de Si é Existência- Consciência-Felicidade.
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4. Quando é que a realização do Si poderá ser obtida?
Quando o mundo, que é aquilo-que-é-visto, for removido, haverá realização do Si que é quem vê.
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5. Não haverá realização do Si, enquanto o mundo for observado como real?
Até lá não haverá qualquer realização.
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6. Por quê?
O observador e o objecto que é visto são como a corda e a serpente. Assim como o conhecimento da corda, que é o substrato, não surgirá a menos que o falso conhecimento da serpente ilusória desapareça, assim a realização do Si, que é o substrato, não será obtida, a menos que a crença de que o mundo é real seja removida.
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7. Quando é que o mundo, que é o objecto visto, será removido?
Quando a mente, que é a causa de todo o conhecimento e de todas as acções, se tornar silenciosa, o mundo desaparecerá.
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8. O que é a natureza da mente?
O que é chamado de “mente” é um poder notável que reside no Si. É ele a causa do aparecimento de todos os pensamentos. Além dos pensamentos, não existe nada a que se possa chamar mente. Portanto, o pensamento é a natureza da mente.
Além dos pensamentos, não há uma entidade independente chamada mundo. No sono profundo, não existem pensamentos e também não há mundo. Nos estados de vigília e de sono com sonhos, existem pensamentos e também existe o mundo.
Tal como uma aranha produz os fios da sua teia, dentro de si mesma e de novo o recolhe para o seu interior, do mesmo modo, a mente projecta o mundo a partir de si mesma e de novo o reabsorve dentro de si.
Quando a mente sai para fora do Si, o mundo aparece. Por isso, quando o mundo aparece (como sendo real), o Si não aparece; e quando o Si aparece (brilha), o mundo não aparece.
Quando alguém investiga persistentemente a natureza da mente, a mente acabará por deixar o Si (como o resíduo).
O que é referido como Si é o Atman*. A mente só existe na dependência de algo concreto; ela não consegue ficar só. A mente é aquilo que se conhece como corpo subtil ou alma.
- * Atman – o Espírito ou o Si. -
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9. Qual é o caminho que deve ser perseguido pela investigação para compreender a natureza da mente?
Aquilo que surge como “eu” neste corpo é a mente. Se procurar onde é que no corpo surge o primeiro pensamento “eu” irá descobrir que ele surge no Coração*. Esse é o lugar da origem da mente. Mesmo quando alguém pensa constantemente em “eu-eu”, será conduzida para aquele lugar.
De todos os pensamentos que surgem na mente, o pensamento “eu” é o primeiro. Só depois do aparecimento deste, é que surgem os outros pensamentos. É depois do aparecimento do primeiro pronome pessoal que o segundo e o terceiro pronomes pessoais aparecem; sem o primeiro pronome pessoal não haverá o segundo nem o terceiro.
- * O Coração espiritual não corresponde ao coração físico situado no lado esquerdo do peito. Reside no lado direito, a dois dedos da linha mediana do peito, entre os mamilos. Para uma melhor compreensão vaja-se a final o ANEXO I -
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10. Como é que a mente se aquieta?
Pela investigação “Quem sou eu?”. O pensamento “Quem sou eu?” irá destruir todos os outros pensamentos e como a vara usada para revolver a pira funerária a arder, ela própria, no fim, será destruída. Então, surgirá a realização do Si ou auto-realização.
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11. Quais são os meios para manter constantemente o pensamento “Quem sou eu?”?
Quando outros pensamentos surgem, não os devemos perseguir, mas sim perguntar: “A quem é que eles surgem?” Não importa quantos pensamentos surjam.
À medida que um pensamento surge, deve inquirir-se com diligência: “A quem é que este pensamento surgiu?”. A resposta que irá emergir será: “A mim”.
Logo em seguida se nos voltarmos a perguntar “Quem sou eu?”, a mente irá voltar para a sua fonte; e o pensamento que surgiu será dissipado ou ficará inactivo.
Com uma prática assim repetida, a mente desenvolverá a capacidade de permanecer na sua fonte. Quando a mente que é subtil vai para o exterior através do cérebro e dos órgãos dos sentidos, os nomes e as formas físicas ou materiais aparecem; quando fica no Coração, os nomes e as formas físicas desaparecem. Não deixar a mente fugir para o exterior, mas mantê-la no Coração é o que se chama “interiorização” (antarmukha). Deixar a mente sair para fora do Coração é conhecido como “exteriorização” (bahirmukha).
Quando a mente fica no Coração, o “eu” que é a fonte de todos os pensamentos desaparecerá e o Si que existiu desde sempre, brilhará. Qualquer coisa que se faça, qualquer acto, deverá ser realizado sem o “eu” egoísta. Ao agir deste modo, tudo surgirá como sendo natureza de Shiva (Deus).
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12. Não existem outros meios para acalmar a mente?
Além da investigação, não existem outros meios adequados. Se através de outros meios procurarmos controlar a mente, ela poderá parecer controlada, mas ficará de novo agitada.
Através do controlo da respiração, a mente aquietar-se-á; mas só ficará calma enquanto a respiração estiver controlada. Quando a respiração retomar o seu fluxo normal, também a mente se irá movimentar e divagar de novo, impelida pelas impressões residuais ou pensamentos. A fonte é a mesma, tanto para a mente como para a respiração. O pensamento é a natureza da mente. O pensamento “eu” é o primeiro pensamento da mente e isso é egoísmo. É daí, de onde surge o “ego” que a respiração também surge. Portanto, quando a mente se aquieta a respiração fica controlada, e quando a respiração está controlada a mente torna-se calma.
Mas no sono profundo, apesar da mente se acalmar, a respiração não pára. No estado de vigília e no samadhi*, quando a mente se torna quieta, a respiração é controlada. A respiração é a forma grosseira da mente. Até ao momento da morte, a mente mantém a respiração no corpo, e quando o corpo morre, a mente leva com ela a respiração. Por tal motivo, o exercício de controlo da respiração é tão-somente um auxílio para que a mente se aquiete (manonigraha); tal exercício não destruirá a mente (manonasa).
- * Samadhi – uma espécie de transe espiritual. -
Assim como a prática do controlo da respiração, meditar sobre as formas de Deus, repetição de mantras, restrições na comida, etc., são apenas ajudas para manter a mente calma.
Através da meditação nas formas de Deus e através da repetição de mantras, a mente concentra-se. A mente irá sempre vaguear. Assim como quando uma corrente é dada a um elefante, para que ele a segure com a sua tromba, ele irá agarrá-la a ela e nada mais, assim também, quando a mente está ocupada com um nome ou com uma forma, ela apenas agarrará esse nome ou forma. Quando a mente se expande na forma de pensamentos incalculáveis, cada pensamento torna-se menos forte; mas logo que os pensamentos se dissipam, a mente torna-se concentrada e forte. Para uma mente assim, a Auto-investigação acaba por se tornar fácil. De todas as regras restritivas, aquela que se relaciona com a comida sattvica* em quantidades moderadas é a melhor. Ao observar esta regra, a qualidade sattvica* da mente aumentará, e isso será um precioso auxílio para a Auto-investigação
- * A alimentação sattvica é constituída por alimentos simples e nutritivos, que mantêm mas não estimulam o corpo físico, diminuindo as excitações que limitam o percurso espiritual do praticante: água, frutas, cereais, pão, legumes (alguns são excluídos), feijões, castanhas, grão, leite e derivados (queijo, manteiga, iogurte)) e mel.
* As qualidades ou virtudes da mente sattvica são: auto-domínio, equanimidade de temperamento, energia, libertação dos desejos, libertação do ódio e da arrogância, pureza de coração, ternura e afeição por todos os seres. -
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13. As impressões residuais (pensamentos) dos objectos parecem sem fim como as ondas do oceano. Quando é que todas elas serão destruídas?
Na medida em que a indagação e a meditação no Si se forem desenvolvendo, os pensamentos serão destruídos.
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14. É possível que as impressões residuais dos objectos que vêm desde tempos imemoriais sejam dissipadas, e que uma pessoa possa permanecer como puro Si?
Sem ceder à dúvida se “é possível ou não?”, deve permanecer-se continuadamente em meditação no Si.
Mesmo que se considere ou se seja um grande pecador, não se deve preocupar e lamentar: “Oh! Eu sou um pecador, como é que posso ser salvo?”. Deve renunciar completamente ao pensamento “eu sou um pecador” e concentrar-se com a máxima intensidade na meditação sobre o Si. Aí, terá certamente sucesso.
Não existem duas mentes; uma boa e a outra má. A mente é só uma. São as impressões residuais que são de dois tipos: favoráveis ou desfavoráveis. Quando a mente está sob a influência de impressões favoráveis ela é chamada de boa e quando está sob a influência de impressões desfavoráveis é vista como má.
Não devemos permitir que a mente vagueie na direcção dos objectos mundanos, nem para o que respeita à vida dos outros. Por muito más que as outras pessoas sejam, não devemos nutrir por elas nenhum ódio.
Tanto o desejo quanto o ódio devem ser evitados. Tudo aquilo que se dá aos outros dá-se a si mesmo. Se esta verdade for compreendida quem não irá dar aos outros?
Quando o Si surge, tudo surge, quando o Si se desvanece, tudo se desvanece. Na medida em que nos comportamos com humildade, na mesma medida resultará o bem. Ao acalmar a mente podemos viver em qualquer lugar do mundo.
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15. Durante quanto tempo deve a investigação ser praticada?
Enquanto existirem impressões dos objectos na mente, a investigação “Quem sou eu?” é necessária.
À medida que os pensamentos surgem, devem ser imediatamente eliminados na sua origem através da investigação. Se se recorre à contemplação permanente do Si, até que este seja realizado, só isso já é suficiente. Enquanto existirem inimigos dentro da fortaleza, eles continuarão a atacar; se eles forem destruídos assim que surgem, a fortaleza cairá nas nossas mãos.
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16. Qual é a natureza do Si?
Na verdade o que existe é somente o Si. O mundo, a alma individual e Deus são aparências dentro do Si. Tal como o prateado da madrepérola, esses três aparecem e desaparecem ao mesmo tempo. O Si é o lugar onde o pensamento “eu” está completamente ausente. Isto é denominado “Silêncio”. O Si, em si, é o mundo; o Si, em si, é o “eu”; o Si, em si, é Deus. Tudo é Shiva, o Si.
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17. Não são todas as coisas o trabalho de Deus?
Sem qualquer desejo, decisão, ou esforço, o Sol surge e na sua mera presença, a pedra-sol emite fogo, o lótus floresce, a água evapora-se, as pessoas executam as suas várias funções e depois descansam. Tal como a agulha da bússola se move na presença de um íman, é na virtude da presença de Deus que as almas são governadas pelas três funções cósmicas ou pelas cinco actividades divinas*. Cumprem as suas acções e depois repousam, como resultado dos respectivos karmas. Deus não tem propósito, nem nenhum karma* a Ele ligado. Isso é como as acções mundanas que não afectam o Sol, ou como os méritos e deméritos dos outros quatro elementos que não afectam o espaço omnipresente.
- * As três funções cósmicas podem ser identificadas com a vontade, sabedoria e actividade.
As cinco actividades divinas são a criação, a preservação, a destruição, a reencarnação e a salvação.
- * Karma – pode ser entendido como o fruto das acções passadas que brotam e condicionam a vida presente. O destino que o homem constrói para si próprio, segundo a lei das causas e efeitos. Também significa acção; a aproximação de Deus através de acções desinteressadas. -
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18. Dos devotos, quem é o maior?
Aquele que se entrega ao Si que é Deus é o mais excelente dos devotos. Dar-se a Deus significa permanecer constantemente no Si, sem dar qualquer espaço para o aparecimento de quaisquer pensamentos que não sejam do Si.
Qualquer fardo que seja lançado sobre Deus, será por Ele suportado. Já que o supremo poder de Deus faz com que todas as coisas se movam, porque deveremos nós, sem nos submetermos a Ele, preocuparmo-nos de modo constante com pensamentos, como o que tem de ser feito, e como fazer, e o que não deve ser feito, e como não fazer? Nós sabemos que o combóio carrega todas as cargas e assim, depois de entrarmos para a viagem, por que é que temos de suportar a nossa pequena bagagem na cabeça, para nosso desconforto, ao invés de a poisarmos no chão da carruagem, ficando aliviados e à vontade?
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19. O que é o desapego?
Assim que os pensamentos surgem, aniquilá-los completamente sem permitir que reste qualquer resíduo no exacto lugar da sua origem, é desapego. Assim como um mergulhador que procura pérolas amarra uma pedra à sua cintura, e mergulha até ao fundo do mar onde apanha as pérolas, assim cada um de nós, deve estar munido de desapego, mergulhar dentro de si e obter a Pérola-Interior (Si-Pérola).
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20. É possível para Deus e para o Guru efectuar a libertação de uma alma?
Deus e o Guru (Mestre) somente irão mostrar o caminho para a libertação. Nem Deus nem o Guru irão levar por eles próprios a alma ao estado de libertação.
Em boa verdade, Deus e o Guru não são diferentes. Assim como uma presa ao cair nas garras de um tigre não tem por onde escapar, assim aqueles que se encontram no âmbito do olhar de graça do Guru serão salvos pelo Guru e não se irão perder.
Ainda assim, cada um deve pelo seu próprio esforço percorrer o caminho indicado por Deus ou pelo Guru e atingir a libertação. Uma pessoa só se pode conhecer a si mesma com a sua própria sabedoria e não com a de outro. Aquele que é Rama precisa de se ver ao espelho para saber que é Rama*?
- * Rama é considerado um dos avatares do Deus Vishnu. O avatar é uma manifestação corpórea de um ser imortal, uma encarnação que é reverenciada como divindade. -
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21. É necessário para aquele que anseia pela libertação investigar sobre a natureza das categorias (tattwas*)?
Assim como alguém que se quer libertar do lixo, não tem necessidade de o analisar e ver o que ele é, do mesmo modo, aquele que quer conhecer o Si não tem que contar o número de categorias ou investigar acerca das suas características; aquilo que tem a fazer é rejeitar todas as categorias que ocultam o Si. O mundo deve ser considerado como um sonho.
- * Tattwas - elementos ou aspectos da realidade. Princípios-raiz. A mente é a base dos princípios-raiz, nomeadamente o indivíduo, Deus e o mundo. Elementos dentro dos quais a existência fenomenal (desde a mente subtil até à matéria grosseira) é classificada. -
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22. Não haverá diferença entre o estar acordado e o sonho?
A vigília é longa e o sonho é curto; além desta não existem outras diferenças. Assim como os acontecimentos no estado de vigília nos parecem ser reais enquanto estamos despertos, do mesmo modo, enquanto sonhamos, os acontecimentos do sonho também nos parecem reais. No sonho, a mente assume outro corpo. Tanto no estado de sonho como quando acordado, pensamentos, nomes e formas ocorrem simultaneamente.
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23. Ler livros tem alguma utilidade para os que desejam atingir a libertação?
Todas as escrituras dizem que para obter a libertação, a mente deve render-se ao silêncio; por isso, o ensinamento final é de que a mente deve ficar calma; uma vez que isto tenha sido entendido, não há necessidade de leituras intermináveis.
Para acalmar a mente, uma pessoa tem somente que investigar dentro de si aquilo que é o Si; como é que essa busca pode ser feita através livros? Deve conhecer-se o Si com a própria visão de sabedoria. O Si está dentro das cinco camadas*, sendo fútil procura-lo nos livros. Chegará um momento em que se terá de esquecer tudo aquilo que se aprendeu*.
- * Cinco envoltórios - material, sensitivo, mental, intelectual e da bem-aventurança.
* A erudição ou o conhecimento das Escrituras deixa de fazer sentido a partir do momento em que o liberto-vivo realiza o Si. A partir daí, mesmo que se recorde dos estudos realizados, só o Verdadeiro Conhecimento releva. -
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24. O que é felicidade?
Felicidade é a real natureza do Si; felicidade e Si não são diferentes. Não há felicidade alguma em qualquer objecto do mundo.
Nós imaginamos através da nossa ignorância, que atingimos a felicidade através dos objectos. Quando a mente vai para o exterior, ela experimenta miséria. Na verdade, quando os seus desejos são satisfeitos, a mente volta ao seu lugar e desfruta da felicidade que é o Si. Tal como no estado de sono sem sonhos, samadhi e desmaio, como quando os objectos desejados são conseguidos ou os objectos não desejados são removidos, a mente volta para o interior e desfruta da pura felicidade do Si. Assim, a mente movimenta-se sem descanso, em alternância, indo para fora do Si e regressando ao mesmo.
Debaixo de uma árvore, a sombra é agradável; fora da sombra o calor é abrasador. Uma pessoa que tenha estado exposta ao Sol, sente-se fresca quando entra na zona de sombra. Alguém que continua a ir da sombra para o Sol e depois volta para a sombra é um tolo. Um homem sábio fica permanentemente na sombra. Similarmente, a mente de alguém que conhece a verdade não deixa Brahman*. A mente do ignorante, pelo contrário, dá voltas e voltas no mundo, sentindo-se miserável e por pouco tempo volta a Brahman para experienciar a felicidade.
De facto, aquilo que é chamado de mundo é somente pensamento. Quando o mundo desaparece, isto é, quando não há pensamento, a mente experimenta a felicidade; e quando o mundo aparece, ela passa pela miséria.
- * Brahman é o Absoluto, não devendo ser confundido com Brahma. O primeiro estágio da manifestação de Brahman é Ishvara, o Deus Pessoal. Ishvara é então concebido sob o tríplice aspecto de Brahma o Criador, Vishnu o Protector e Shiva o Destruidor. -
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25. O que é sabedoria-intuitiva (jnana-drshti)?
Permanecer calmo é o que se chama visão de sabedoria. Ficar calmo é levar a mente ao Si. Telepatia, conhecer o passado, presente ou futuro, acontecimentos, e clarividência não constituem visão de sabedoria.
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26. Qual é a relação entre ausência de desejo e sabedoria?
Ausência de desejo é sabedoria. Os dois não são diferentes; eles são o mesmo. A ausência de desejo é evitar voltar a mente na direcção de qualquer objecto. Sabedoria significa a ausência de objectos. Por outras palavras, não buscar outro que não seja o Si é desapego ou ausência de desejo; não abandonar o Si é sabedoria.
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27. Qual é a diferença entre investigação e meditação?
A investigação consiste em manter a mente no Si. A meditação consiste em pensar que o seu próprio ser é Brahman, Existência – Consciência – Felicidade.
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28. O que é a libertação?
Investigar sobre a natureza do ser que está escravizado e realizar a sua verdadeira natureza, isto é libertação.
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NAN YAR
Traduzido para inglês por T. M. P. M MAHADEVAN do original Tamil.
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ANEXO I
O CORAÇÃO MÍSTICO
O Coração a que se refere Ramana Maharshi e alguns outros místicos* carece de uma explicação mais detalhada da que nos é apresentada no texto.
- *Entre outros, mesmo no Ocidente, e na segunda metade do século XVIII, um estaroste ucraniano, Basílio de Poiana-Marului (da Clareira das Ameixeiras), situou o “coração” espiritual um pouco acima e à direita do coração físico, que para ele era estava ligado ao thymos, ao ardor, sobre o qual deve reinar o coração espiritual. -
Como exemplo, pode dizer-se, que sempre que nos referimos a nós mesmos, geralmente apontamos o dedo para o lado direito do peito. Trata-se de um movimento intuitivo. Para uma melhor compreensão do que é o Coração místico e onde se situa, segundo os ensinamentos de Sri Bhagavan, reproduzimos parte de um diálogo que este teve com um visitante.
Visitante:
- Sri Bhagavan fala do Coração como a sede da Consciência e como sendo idêntico ao Eu. O que é que significa exactamente o Coração?
Maharshi:
– A pergunta sobre o Coração surge, porque está interessado em descobrir a Fonte da Consciência. Para todas as mentes que pensam profundamente, a questão sobre o “Eu” e a sua natureza, tem um fascínio irresistível. Chame-o por qualquer nome. Deus, Eu, o Coração ou a Sede da Consciência – ele é sempre a mesma coisa. O que tem de ser compreendido é isto: que o Coração significa a própria essência da existência de alguém, o centro sem o qual nada mais há.
Visitante:
- Mas Sri Bhagavan especificou um lugar próprio para o Coração, dentro do corpo físico, dois dedos à direita do centro do peito.
Maharshi:
- Sim, esse é o centro da experiência espiritual de acordo com o testemunho dos sábios.
Visitante:
- Para homens como eu que não viveram a experiência directa do Coração nem a sua consequente recordação, o tema parece ser um pouco difícil de alcançar. Sobre a posição do Coração, talvez careçamos de depender de uma espécie de adivinhação.
Maharshi:
- Se a determinação da posição do Coração dependesse de adivinhação, mesmo no caso de um leigo, a questão não daria ensejo a quaisquer considerações. Não, não é da adivinhação que tem de depender, mas sim de uma intuição infalível.
Visitante:
- A quem se destina a intuição?
Maharshi:
- Para todos sem excepção.
Visitante:
- Sri Bhagavan reconhece mérito num conhecimento intuitivo do Coração?
Maharshi:
- Não, não do Coração, mas da posição do Coração em relação à sua identidade.
Visitante:
- Sri Bhagavan diz que eu conheço intuitivamente a posição do Coração no corpo físico?
Maharshi:
- Porque não?
Visitante apontando com a sua mão e dedos para si próprio:
- É a mim pessoalmente que Sri Bhagavan se está a referir?
Maharshi:
- Sim, isso é a intuição! Veja como se referiu a si mesmo por gestos, neste preciso momento. Não colocou o seu dedo no lado direito do peito? Esse é exactamente o lugar do Coração, do seu centro espiritual.
Visitante:
- Então, na ausência do conhecimento directo do Coração, centro espiritual, tenho que depender desta intuição?
Maharshi:
- E o que é que essa intuição tem de errado? Quando um estudante diz, “fui eu que fiz a soma correcta” ou quando lhe pergunta: “Devo correr e apanhar o livro para si?”, deverá apontar para a cabeça que fez a soma correcta, ou para as pernas que o levarão rapidamente ao local do livro para lho poder entregar de imediato? Não, em ambos os casos, o seu dedo aponta naturalmente na direcção do lado direito do peito, dando assim uma inocente expressão à suprema verdade, de que a fonte do seu Si é ali que está. É uma intuição infalível que faz com que ele se refira daquela forma ao Coração que é o Si, sendo o acto completamente involuntário e universal; quer dizer, é o mesmo em todos os indivíduos. Que prova mais evidente do que esta necessita para situar a posição do Coração, centro espiritual do Homem no corpo físico?
Visitante:
- Mas eu ouvi um santo dizer que alcançou a sua experiência espiritual no lugar que se localiza entre as sobrancelhas*.
- * É onde se localiza o chakra frontal, também denominado o “olho de Shiva”. São muitos os que fazem os seus exercícios de concentração nesse ponto. -
Maharshi:
- Como já disse, esta é a realização última e perfeita, que transcende a relação sujeito-objecto. Quando é alcançada, deixa de ter qualquer importância o local onde a experiência espiritual foi percepcionada.
Visitante:
- Mas a questão é: qual das duas é correcta, no centro da experiência espiritual entre as sobrancelhas ou no Coração?
Maharshi:
- Pode praticar a concentração de olhos fechados entre as sobrancelhas; seria então bhavana ou contemplação imaginativa da mente, enquanto o estado supremo de Anubhaya ou realização, no qual a sua individualidade é completamente dissolvida, transcende a mente. Então, não pode haver nenhum centro para ser experimentado.
Visitante:
- Como poderei, deste modo, compreender a afirmação de Sri Bhagavan, que a “experiência” do Coração, centro espiritual, está num lugar particular do peito?
Maharshi:
- Uma vez que aceita como ponto de vista verdadeiro e correcto que o Coração, como consciência pura, está para além do espaço e do tempo, será fácil compreender o resto, na perspectiva correcta.
Visitante:
- Foi somente nesta base que eu fiz a pergunta sobre a posição do Coração. Estou a questionar sobre a experiência de Sri Bhagavan.
Maharshi:
- A consciência pura, completamente desligada do corpo físico e transcendental à mente, é uma questão de experiência directa. O sábio conhece a sua existência imaterial e eterna, assim como o leigo conhece a sua existência física.
Mas a experiência pode ser alcançada quer se esteja consciente do corpo ou não. Na existência imaterial da consciência pura, o sábio está para além do tempo e do espaço, e não surge nenhuma pergunta sobre a posição do Coração. Entretanto, porquanto o corpo físico não pode permanecer à parte da consciência, a percepção do corpo é sempre sustentada pela consciência pura.
O corpo, pela sua natureza, é limitado, e não pode nunca ser eterno como a consciência pura, que é infinita. O reflexo da consciência no corpo é simplesmente uma espécie de morada (primeiro raio da consciência, raio da origem da consciência pura, ou seja, cósmica), reflexo miniatura da dita consciência pura, com a qual o sábio realizou a sua identidade. Para ele, a consciência do corpo é somente um raio reflectido da cintilante e infinita consciência, que é ele próprio. E é somente neste sentido que o sábio está consciente da sua existência física.
Durante a experiência imaterial do Coração como consciência pura, o sábio não se apercebe do corpo. Aquela experiência absoluta é por ele localizada dentro dos limites do corpo físico como uma espécie de recordação dos sentidos, deixada enquanto ele estava com a percepção do corpo.
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Vista de Arunachala
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ANEXO II
A RELIGIÃO DO CORAÇÃO
Perguntaram certo dia a Ramana Maharshi se não seria possível a humanidade viver toda em paz, apesar de haver tantas divisões religiosas. Apregoando-se tanto um único mundo, logo um qualquer estado invade outro ou são cometidas as maiores atrocidades, massacres e genocídios. As religiões não se encontram de acordo e nalguns casos os seus crentes chegam ao ponto de se odiar e matar. Como é que poderemos, de algum modo, destruir estas incompreensíveis diferenças?
Maharshi respondeu:
- Todas as religiões impostas agrilhoam o homem a uma personalidade, a uma crença, livro ou a um lugar. Aquilo que chamamos de religião Hindu dá-vos a liberdade completa para seguir a vossa alma desperta. O despertar interno é o olho que encontra o caminho do Ser para a Bem-Aventurança.
Só existe uma religião, um dharma e um yoga para todos. É o “Eu” consciente no Coração. O Coração é o Ser; o Coração é o centro do “Eu”.
A Religião do Coração é a única Religião para toda a humanidade.
Em qualquer religião a que pertençamos o Coração é uno e o “Eu” é uno. O Coração é a consciência pura; a última verdade que tudo abarca.
A mente concreta confunde o corpo com o “Eu”. O Ser é o supremo “Eu Sou”, o verdadeiro habitante da Cova do Coração.
Quando a mente habita no Coração o mundo material desaparece. O mundo não é nada mais para além da mente. Os nomes, formas, preceitos, castas, crenças e religiosidade são concepções mentais. O sábio que atingiu a iluminação apreende a mente perdida na luz do Coração. Deus não é nada mais do que o Coração. Os sábios conhecem a sua existência incorpórea impessoal assim como o leigo conhece a existência corpórea ou pessoal. Tal sábio está para além do espaço, do tempo e da causalidade. Pouco se importa com personalidades, cultos e religiões dogmáticas e fanáticas.
O Hinduísmo é uma experiência impessoal ou absoluta, que por meio de “Atma Vichara” conduz à realidade do “Eu”. O Ser é Deus. “Eu Sou” é Deus. Conhecer o Eu-Ser é ver Deus.
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Um discípulo perguntou a Ramana Maharshi:
- Mestre, posso auxiliar o mundo?
Maharshi disse:
Ajuda-te a ti mesmo e estarás a ajudar o mundo. Estás no mundo, és o mundo. Não és diferente do mundo, nem o mundo é diferente de ti.
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DOWNLOAD DO TEXTO DO BLOG
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José Maria Alves
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