A Sidarta Gautama
***
como um elefante
no campo de batalha
resiste às flechas
deves
suportar com paciência
as palavras maldosas
que te são dirigidas
há muitas pessoas
a quem falta a virtude
e o mundo está repleto de homens vis
um elefante treinado
é dócil
e ajoelha-se
para que o rei o monte
grande docilidade tem o homem
que suporta injúrias
e calúnias pacificamente
excelentes são as mulas
bem treinadas
excelentes os cavalos de guerra
bem adestrados
magníficos os elefantes
bem domados
grande é o homem
que a si se ensina
e se disciplina
no entanto
não é usando as montadas
que alguém atinge o nirvana
o nirvana atinge-se
com autodomínio
e com a mente disciplinada
***
quando um homem
é indolente e lambão
dormindo em qualquer lugar
onde se deita
assemelha-se ao velho elefante
a quem se dá de comer
por compaixão
estará sempre sujeito
ao círculo dos renascimentos
anteriormente
esta mente vagueou
como quis
até onde bem desejou
e de acordo
com o seu prazer
agora
está naturalmente aperfeiçoada
com a verdadeira sabedoria
como o tratador de elefante
o controla com o seu aguilhão
na época do cio
***
vigia-te a ti mesmo
delicia-te na diligência
guarda os teus pensamentos do erro
sai para fora deste lodaçal do mal
tal como um elefante sai da lama
***
se como companhia
encontras
um amigo sábio e prudente
levando uma vida de bondade
deves
superando todos os impedimentos
manter essa companhia
com alegria e discernimento
se como companhia não encontras
um amigo sábio e prudente
que leva uma vida de bondade
então
como um rei
que deixa para trás
um reino conquistado
ou como um elefante
solitário na floresta
segue o teu caminho
sozinho
melhor é viver sozinho
do que na companhia
dos insensatos
vive
e
caminha sozinho
não faças mal
a nenhum ser
sê despreocupado
calmo
e livre
como um elefante na floresta
é bom ter amigos
quando a infelicidade
nos bate à porta
bom
é estar contente
com o que se tem
bom
é ter mérito
quando a vida
chega ao fim
afrontando a morte
com um espírito sereno
bom
é quando nos libertamos
de todo o sofrimento
seguindo
o caminho da libertação
neste mundo
bom é servir a mãe
bom é servir o pai
bom é servir os monges
bom é servir os homens santos
que felicidade
quando a nossa conduta
é sempre correcta
bom
é ter virtude até ao final da vida
bom
é ter uma fé que se mantém firme
bom
é adquirir sabedoria
o melhor é evitar todo o mal
***
a avidez
de uma criatura
que vive descuidada
cresce como uma trepadeira
como macaco
que procura frutas na floresta
quem quer que se deixe derrotar
por esta avidez ou anseio miserável e viscoso
verá a suas tristeza
crescer como joio
depois das chuvas
mas o que vencer
esta avidez
tão difícil de vencer
verá que os seus sofrimentos
não são mais do que o peso
de uma gota de orvalho
na folha de lótus
por isso vos digo
arrancai de vós
a raiz da avidez
como o jardineiro
arranca as ervas daninhas
só assim
a morte
não vos levará com ela
como uma árvore
que apesar de abatida
se as raízes se mantiverem
intactas e firmes
germina de novo
assim o sofrimento
surgirá sempre
enquanto as raízes da avidez
permanecerem na mente
o homem enganado
no qual as correntes da paixão
ainda correm vigorosamente
em direcção aos objectos aprazíveis
é varrido pela torrente
dos seus pensamentos apaixonados
torrentes
que fluem por todo o lado
e tudo arrastam
o tojo alastra
por todos os lados
se vires o tojo
crescer
arranca-o pela raiz
***
abandonando-se ao rio grande dos desejos
os homens buscam satisfazer as suas paixões
ansiando pelos prazeres mundanos
nascem e morrem continuamente
atormentados pelo anseio
os homens correm como
a lebre prisioneira
presos por bloqueios mentais
regressam ao sofrimento
uma e outra vez
por longo período de tempo
atormentadas pelo desejo
as pessoas correm como
uma lebre perseguida
aquele que anseia
pela libertação das paixões
deve aniquilar o seu próprio desejo
há quem se afaste dos desejos
adoptando a vida da floresta
na busca do nirvana
mas depois de sair
dos hábitos mundanos
corre de volta para eles
observai esse homem
apesar de livre
retorna à escravidão
***
os sábios dizem
que correntes
de ferro
madeira
ou corda
não são fortes
mas da paixão
e do desejo intenso
por joias
ornamentos
luxos
mulheres
dizem que
é uma corrente
bem mais forte
e que apesar
de aparentemente solta
é a mais difícil de romper
os sábios
cortam-na
sem desejo e saudade
abandonando o prazer sensual
renunciam ao mundo
os homens presos pela avidez
vivem na corrente das paixões
tal como a aranha na sua teia
esta teia
também os sábios rompem
escapando livres
de qualquer desejo
e sofrimento
***
deixa o passado
deixa o futuro
deixa o presente
passa para a margem
mais distante da existência
com a mente plenamente livre
não regressarás jamais
ao círculo dos nascimentos e das mortes
***
para uma criatura
atormentada por maus pensamentos
que é dominada pela paixão
e dada à busca do prazer
a avidez cresce constantemente
cria uma forte prisão
a criatura
que com alegria
subjuga os maus pensamentos
que se mantém serena e em paz
que medita sobre o sofrimento
que está sempre consciente
porá um fim à avidez
e saberá desfazer
todas as urdiduras da morte
o que pleno
de sabedoria
se mantém
sereno
em paz
que é destemido
livre de avidez
ou anseio
livre da paixão
e arrancou
os espinhos da existência
este é o seu último corpo
o que está livre
do desejo e apego
livre de todas as manchas
que se aperfeiçoou em descobrir
o verdadeiro significado do ensinamento
vive na verdade pela última vez
e todos o terão como sábio
***
eu sou o vencedor supremo
o conhecedor supremo
liberto de tudo
da própria ilusão da vida
de mim próprio tudo aprendi
quem poderá então ter sido o meu mestre
***
o dom da verdade supera todos os dons
o sabor da verdade supera todos os sabores
a alegria da verdade todas as verdades
quem se libertou da avidez
ou do anseio
vence todo o sofrimento
as riquezas
arruínam
os insensatos
não os que buscam a libertação
por almejar riquezas
o imbecil arruína-se tanto a si
como aos outros
as ervas daninhas
são a ruína dos campos
a cobiça e a luxúria
são a ruína da humanidade
tudo quanto é oferecido
aos que são livres de cobiça e luxúria
produz frutos abundantes
as ervas daninhas
são a ruína dos campos
o ódio
é a ruína da humanidade
tudo quanto é oferecido
aos que estão livres de ódio
produz frutos abundantes
as ervas daninhas
são a ruína dos campos
a ilusão
é a ruína da humanidade
tudo quanto é oferecido
aos que estão livres de ilusão
produz frutos abundantes
as ervas daninhas
são a ruína dos campos
o desejo e a avidez
são a ruína da humanidade
tudo quanto é oferecido
aos que estão livres de desejo e avidez
produz frutos abundantes
***
bom
é o domínio da visão
bom
é o domínio da audição
bom
é o domínio do olfacto
bom
é o domínio do paladar
bom
é que se esteja sempre atento
bom
é ter domínio do corpo
bom
é o domínio da fala
bom
é estar atento às sensações
bom
é estar atento às nossas palavras
bom
é o domínio do pensamento
bom
é que se esteja atento à mente
o monge que está sempre atento
alcançará a bem-aventurança
pelo fim do sofrimento
aquele que tem o controlo
sobre as suas mãos e pés
das suas próprias palavras
que está totalmente controlado
sempre em paz
solitário e feliz
com a sua própria condição
esse é o verdadeiro monge
o monge que tem controlo
sobre a sua língua
que é regrado
no discurso simples
que com humildade
expõe o ensinamento da verdade
tanto na letra
como em espírito
é ouvido
com agrado pelos homens
o monge
que permanece na doutrina
que se delicia na doutrina
que nela medita
que a tem sempre presente na sua mente
é fiel ao caminho da verdade
***
não se devem desprezar
as esmolas recebidas
nem invejar as dos outros
o monge que inveja
o proveito dos outros
nunca alcançará
a suprema concentração
o monge que não despreza
o que recebeu
mesmo que pouco seja
é louvado pelos deuses
pela sua constância e pureza
o que não tem qualquer
apego de mente e corpo
para quem não existem
as noções de eu e do meu
nesta vida efémera
que não se lamenta
por aquilo que não tem
é verdadeiramente um monge exemplar
o monge
que permanece no amor integral
que é profundamente devotado
ao ensinamento do buda
alcança a paz do nirvana
***
despeja este pesado
barco da vida
da água que o inundou
ó monge
vazio navegarás com leveza
livre da paixão da carnalidade e do ódio
alcançarás o nirvana
decepa e liberta-te completamente
das correntes da ilusão
só assim monge
conseguirás atravessar
a torrente de todas as correntes
medita ó monge
não sejas negligente
não deixes que as paixões
entrem no teu coração
inconsciente
ó monge
não tragues
uma bola de ferro em brasa
que te fará gritar
oh
que sofrimento
***
não há concentração meditativa
para o que não tem
compreensão introspectiva
nenhuma sabedoria introspectiva
pode ser alcançada por quem não tem
concentração meditativa
aquele em que se encontram
tanto a concentração meditativa
como a compreensão introspectiva
está perto do nirvana
***
o monge
que se retirou para um eremitério
que acalmou a sua mente
que compreende
profundamente a doutrina
existe nele
uma bem-aventurança
que transcende
todas as doçuras humanas
e se atravessar
o círculo dos nascimentos e das mortes
atingirá o nirvana
***
um monge sábio
deve controlar os seus sentidos
alegrar-se com a sua condição
mantendo-se fiel à doutrina que abraçou
que o monge
escolha companheiros devotos
virtuosos
com uma vida sem mácula
que seja
cordial
educado
benevolente
puro
em pensamento
e na acção
encontrará
o fim do sofrimento
***
como a trepadeira
de jasmim
deixa tombar
flores murchas
da mesma maneira
ó monges
deixai que caia de vós
toda a luxúria
avidez e ódio
***
o monge
com um corpo calmo
sereno no falar
tranquilo no pensamento
bem controlado
que renunciou à vida mundana
esse na verdade
é o verdadeiro monge
que não se perturba
com as preocupações da vida
***
cada um deve reprovar-se
examinar-se a si mesmo
o monge que se vigia
que está atento
vive no seio da felicidade
***
cada um é o seu próprio mestre
cada um é o protector de si mesmo
cada um é o refúgio de si mesmo
cada um deve dominar-se
da mesma maneira que um treinador
domina um cavalo selvagem
***
o monge
pleno de felicidade
conhecedor da doutrina de buda
atingirá o reino da paz
onde deixam de existir
problemas e preocupações
o monge
que embora jovem
se dedica
ao ensinamento de buda
ilumina este mundo
como a lua
que emerge das nuvens
***
esforça-te ó homem santo
corta o fluxo da avidez
descarta os desejos sensuais
conhecendo a destruição
de todas as coisas condicionadas
torna-te ó homem santo
o conhecedor do nirvana
quando um homem santo
atingiu o vértice do caminho
da concentração meditativa
da compreensão introspectiva
todas as suas preocupações desaparecem
a sua visão torna-se clara
e atinge a verdade
***
aquele para quem não existe
nem esta nem a outra margem
para quem esta vida
e a vida do além
se encontram desveladas
que está livre
de preocupações
e sem apegos
o que medita
pacífico
sem mácula
que cumpriu a sua missão
tendo alcançado
o objectivo mais elevado
esse é o homem santo
***
o sol brilha durante o dia
a lua brilha à noite
o guerreiro brilha
na armadura
o homem santo
brilha
ao meditar
mas só o buda
brilha resplandecente
dia e noite
***
o espírito do santo
desembaraçou-se do mal
aquele que vive sozinho
é um eremita
o que renuncia
a todo o mal
é um liberto-vivo
***
não se deve
ofender
nem
atacar
um homem santo
não deve
um homem santo
quando ofendido
ou atacado
dar lugar à raiva
maldito é aquele
que ofende ou atinge
um santo homem
maldito o santo
que responde
a uma ofensa ou agressão
***
nada melhor
para um homem santo
do que subjugar a mente
às suas tendências
à medida que a intenção
de fazer o mal desaparece
também o sofrimento desaparece
aquele
que nenhum mal faz
em acção
em palavra
em pensamento
que é prudente
nestes três princípios
esse
é o homem santo
***
assim como um brâmane
reverencia o fogo sacrificial
da mesma forma
se deve reverenciar o homem
de quem se aprendeu
o ensinamento de buda
***
nem
pelo cabelo entrançado
nem
pela linhagem
nem
pelo nascimento
alguém se transforma
num homem santo
o que segue
a doutrina verdadeira
é um homem santo
de que serve
o teu cabelo entrançado
ó homem insensato
e as vestes
de pele de antílope
só te preocupas com a tua aparência exterior
limpo por fora e corrompido por dentro
o que usa
um hábito
feito de trapos
magro
pálido
mostrando as veias
sobre todo o seu corpo
que medita
sozinho na floresta
merece o nome de santo
eu não chamo a um homem
santo
só por ter nascido brâmane
se está repleto de apegos
é apenas um arrogante
o que é livre
de oposições e apego
o que depois de ter cortado
todos os grilhões com a existência
e que nunca sentiu
qualquer espécie de temor
que superou
todos os apegos
liberto de toda a preocupação
o que cortou
o fio do ódio
o laço da cobiça
a corda da ilusão
liberto de toda
a preocupação
desperto já neste mundo
o que
sem ressentimentos
suporta injúrias
suporta calúnias
suporta agressões
suporta a prisão
suporta a morte
cujo verdadeiro poder
é a paciência
e a serenidade
o que está livre da cólera
e com humildade tudo suporta
vivendo serenamente a sua última vida
como uma gota de orvalho
sobre uma folha de lótus
ou um grão de mostarda
cai da ponta de uma agulha
é o que não tem desejos
a quem chamo
de homem santo
o que ainda
durante esta vida
compreende por si
o fim do sofrimento
liberto de qualquer fardo
livre de toda a preocupação
esse é o homem santo
o que tem
um conhecimento profundo
que é sábio
que faz uma distinção correcta
entre o caminho certo e o errado
que observa claramente
o caminho da libertação
que atingiu
o mais alto
objectivo da doutrina
a esse chamo de homem santo
o que se mantém distante
tanto de chefes de família
como dos ascetas
que
foge das relações
com o mundo
não se ligando a ninguém
sem tecto
caminhando
sem desejo
sem preocupações
que de pouco
ou nada precisa
a esse chamo de homem santo
o que renunciou
à violência
para com todos os seres vivos
que não mata
nem faz com
que os outros matem
a esse chamo de homem santo
sem cólera
sem hostilidade
neste mundo de cólera
sem defesa
neste mundo
de guerra permanente
sem desejo
e apego
neste mundo de desejos
a esse chamo de homem santo
aquele cuja
lascívia e vaidade
ódio e impostura
caíram
como uma semente de mostarda
cai da ponta de uma agulha
a esse chamo de homem santo
***
o que profere
palavras claras de verdade
que não ofende ninguém
o que neste mundo
não se apodera de nada
que não lhe tenha sido oferecido
o que nada quer
tanto deste mundo
como do mundo do além
livre da cobiça
de preocupações
o que sem apego
que através do conhecimento perfeito
está liberto de todas as dúvidas
e chegou à outra margem
o que neste mundo
se afastou do mérito
e do demérito
que não tem inquietação
que é puro e cristalino
aquele que esplende
como a lua cheia
límpido puro
sereno
que se libertou
dos desejos
o que depois de ter
atravessado o pântano
escapou aos erros
à roda dos nascimentos
que atravessou
e chegou à outra margem
que medita calmo
desprendido de dúvidas
que não se apegou a nada
que se livrou
de todas as preocupações mundanas
que alcançou o nirvana
o que tendo abandonado
os prazeres do amor
que renunciou à vida no lar
e aos desejos
tornando-se um mendicante
o que tendo abandonado o desejo
renunciou à vida do lar
tornando-se um mendicante
destruindo toda a avidez
o que fugiu
dos reinos humanos
que escapou
ao mundo dos deuses
totalmente livre
de todas os cativeiros
o que se afastou
de todos os prazeres
e desgostos
que se tornou tranquilo
livre dos substratos da existência
que como um herói
conquistou todos os mundos
o que separado de tudo
feliz e desperto
abençoado e luminoso
conhece a morte
o renascimento
de todos os seres
o homem de quem deuses
anjos e humanos
não conseguem encontrar rasto
conhecedor
da verdade
da extinção
todo aquele para quem
o passado
o presente
o futuro
nada são
que nada deseja
que a nada se apega
que de nada se apossa
o indizível
o excelente
o sublime
o vencedor de todo o sofrimento
o conhecedor da verdade
o mestre puro dos deuses
o mestre puro dos homens
o liberto-vivo
o que conhece
as suas vidas anteriores
que vê o céu
e o mundo dos abismos
que se libertou
da roda dos nascimentos
que atingiu
a perfeição da doutrina
o sábio que alcançou
o auge
da elevação espiritual
a esse chamo
e será sempre conhecido
por homem santo
***
Versão livre do Dhammapada - Buda
***
José Maria Alves
https://homeoesp.blogspot.com/
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