sábado, 27 de junho de 2009
AFONSO DUARTE (1844-1958) - GRITO
Não posso já com ervas nem com árvores:
Prefiro os lisos, frios mármores
Onde nada está escrito.
Meu gosto da paisagem fez-se escuro;
Nenhures é o lugar que mais procuro
Como homem proscrito.
Eu bem sei: A verdura! A flor! Os frutos!
Mas não posso passar de olhos enxutos,
Meu campo verde aflito.
Porventura cegaram os meus olhos
Porque há nos silveirais flores aos molhos
- Tanta flor me tem dito.
Mas eu bem sei que movediços lodos
Que são o chão, as lágrimas de todos,
Meu coração contrito.
Eu não sei se amanhã será meu dia;
Recolho-me furtivo na poesia,
Incerto o chão que habito.
Ai de mim! Ai de mim, nuvem medonha!
Os homens conheci, bebi peçonha,
E é por isso que grito.
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